A Lei Geral de Proteção de Dados, a chamada LGPD, está em vigor desde agosto de 2021. Espera-se que os dispositivos da nova legislação contribuam para uma reformulação na maneira como empresas e agentes governamentais gerenciem informações privadas dos cidadãos.
No entanto, apesar das expectativas em torno de mudanças, alguns especialistas já identificaram entraves significativos em torno da aplicação da nova lei. O mais significativo deles está relacionado ao sistema de justiça brasileiro, cujas instituições estão imersas em uma cultura marcada pelo princípio da publicidade.
A título de exemplo podemos citar os autos processuais. Essas peças estão recheadas de dados pessoais, tanto de empresas quanto de pessoas, de modo que pode ser difícil conciliar a publicização dos processos – exigência do Código de Processo Civil (CPC) – e a Lei Geral de Proteção de Dados.
Neste artigo, nos aprofundamos nessa discussão ao tratamos dos caminhos possíveis para a aplicação da LGPD na justiça. Continue a leitura e saiba mais.
LGPD na justiça: transparência x proteção de dados
O acesso a dados de processos eletrônicos está previsto da Resolução nº 121/2010 do CNJ. Tal resolução estabelece que qualquer pessoa pode consultar eletronicamente informações básicas de cada processo, como o nome das partes e seus advogados.
Já os autos do processo, por sua vez, estão disponíveis apenas para operadores do sistema de justiça, como advogados, procuradores e defensores públicos, ainda que eles não sejam parte na causa.
Frente a este cenário, é impossível não projetar um conflito entre os dispositivos da LGPD e a publicidade ampla dos processos eletrônicos. Resta, portanto, o questionamento: entre a transparência e a proteção de dados, qual princípio deve prevalecer? Haverá alguma alteração na forma como se dá publicidade aos processos?
O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) já emitiu uma resolução prevendo adequações necessárias do sistema de justiça a LGPD, mas não houve qualquer mudança na forma como os dados de processos judiciais são publicizados.
Aplicação da LGPD na justiça deve ser adaptada
Como não existem na LGPD e no Código de Processo Civil regras específicas sobre quais dados pessoais são considerados sigilosos, a regulamentação ainda deve acontecer por intermédio de decisão judicial.
A questão é de grande interesse para o mercado jurídico, pois a coleta de dados processuais nos sites dos tribunais é fundamental para o trabalho da comunidade científica. Nesse sentido, como exemplo, temos as chamadas legaltechs, que fazem uso macisso das informações informações disponibilizadas pelo judiciário.
Como alguns advogados já conhecem, tratam-se de startups cujo principal insumo são os dados de processos judiciais, com os quais são desenvolvidas metodologias de análise de dados (big data) que permitem realizar uma série de diagnósticos sobre o desempenho do Judiciário no Brasil, bem como desenvolver ferramentas de inteligência artificial voltadas a análise preditiva.
CNJ cria Comitê Consultivo de Dados Abertos e Proteção de Dados do Judiciário
Embora a aplicação da LGPD no judiciário ainda demande muitas definições, o primeiro passo já foi dado com a criação do Comitê Consultivo de Dados Abertos e Proteção de Dados do Judiciário pelo CNJ.
Entre as principais proposições do comitê, temos:
- determina criação padrões de interoperabilidade e de disponibilização de dados de processos judiciais por meio APIs (Application Programming Interfaces);
- define parâmetros para padronização da cobrança pelo acesso informações;
- propõe medidas para que sejam observados os direitos e garantias previstos na LGPD;
- estabelece a realização de estudos para aperfeiçoamento dos critérios e metadados de armazenamento e disponibilização de conteúdos de acordo com a evolução de inteligência artificial aplicada ao Direito.
A partir dessas deliberações, é esperado que tenhamos o início de uma adequação consistente às determinações da LGPD.
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